segunda-feira, 2 de abril de 2012

CRÍTICA LITERÁRIA:OTTO MARIA CARPEAUX

Otto Maria Carpeaux e a crítica literária para um Brasil indiferente

''A relevância da obra ensaística do crítico Otto Maria Carpeaux para cultura universal e, especialmente a brasileira, é, irrefutavelmente, uma sentença ao advento do...''
Por Fernando Atallaia

A relevância da obra ensaística do crítico Otto Maria Carpeaux para cultura universal e, especialmente a brasileira é, irrefutavelmente, uma sentença ao advento do pensamento moderno responsável por lançar as bases do fortalecimento da identidade nacional, em época contemporânea.

Quer seja ele cultural( estética, literatura, filosofia), quer seja estrutural(na abrangência de uma política cultural voltada à deflagração dos valores imateriais, artísticos e signos passivos de análise), este pensamento do crítico literário no humanista se fundiu de forma exemplar e antagônica.

A soberba do conhecimento de Otto Maria Carpeaux no Brasil ganha carga de continentalidade e as fibras tropicais de um país que na visão do crítico arguto foi bem mais que as odes nativistas de um Modernismo que estagnou no folclorismo barato de quem ovacionou a dita 'cultura brasileira' na ambiência dos aspectos naturais e empíricos de uma nação já explorada e devidamente dominada por uma burguesia ''detentora'' do conhecimento e da sapiência.

O nosso ensaísta amava e amou este país para além destas e outras configurações restritivas e aparou as arestas existentes: imprimiu no Brasil local, tribal e protecionista a cultura clássica e a erudição em níveis compatíveis. Otto sabia lapidar e por em gradação um Raul Bopp de Cobra Norato com as verves histórico-pensamentais de um Sócrates monumental, que na sua visão, sempre foi um gênio inacabado. Assim como o nosso Brasil até hoje o é.

A obra crítica de Otto Maria Carpeaux, um dos autores de minha predileção no Ensaio e História Literária é hoje revivida, relembrada e contextualizada por este texto meu de apresentação. Serei conciso e breve. Aí vai também a rápida  abordagem de Carlos Heitor Cony. Boa Leitura!
 

Fernando Atallaia foi repórter-correspondente dos jornais Tribuna do Nordeste, Extra, A Tribuna e A Tarde entre os anos 2004 e 2013 em São José de Ribamar. Editor de Cultura da extinta revista Caminhos do Maranhão, foi colunista dos Jornais Portal do Maranhão, Tribuna Popular Luminense, A Tarde e Jornal Pequeno (Suplemento JP Turismo). Atualmente é o Editor-Chefe e Publisher do blog oficial da Agência de Notícias Baluarte-ANB Online. Além de jornalista, é cantor, compositor, músico e poeta. Prêmio Estadual de Poesia do ano 2001 da Universidade Federal do Maranhão-UFMA, Fernando Atallaia tem 19 livros inéditos, dentre os quais se destaca o denso Ode Triste para Amores Inacabados. 

Impressões sobre Otto

A importância da atuação de Otto Maria Carpeaux na cultura nacional é um fato que nunca foi contestado, embora nem sempre compreendido em sua extensão humanística. Durante a sua vida, formou-se em torno dele um grupo de intelectuais e artistas que nele encontraram, em primeira mão, as tradicionais heranças que sempre buscáramos na Europa, momentaneamente interrompidas pela segunda guerra mundial.

Agora, 21 anos após a sua morte, com a reedição cuidadosa de suas obras principais pela Faculdade da Cidade Editora sob orientação de Olavo de Carvalho, as novas gerações nele poderão encontrar a visão abrangente de um verdadeiro scholar, de um espírito superior que armazenou amplos conhecimentos em vários setores da cultura ocidental e soube transmiti-los em notável coleção de ensaios, artigos e estudos.

No substancioso prefácio à reedição dos principais livros de Carpeaux, assinado por Olavo de Carvalho, temos um painel crítico desse importante momento da vida cultural brasileira. Ao mesmo tempo em que Carpeaux transmitia, também assimilava, interpretava e ampliava a nossa realidade intelectual. Daí que dois dos maiores espíritos daquela época, Carlos Drummond de Andrade e Alceu Amoroso Lima, apesar de cultivarem pontos de vista diferentes, uniram-se em consenso para realçar a importância do autor de A Cinza do Purgatório no panorama paroquial de nossa cultura.

Curiosamente, Carpeaux e Olavo não se conheceram. Um dos desencontros que eu considero mais cruéis do destino, uma vez que os dois, guardadas as posições radicalmente pessoais de cada um, tinham um approach idêntico da condição humana. Até mesmo na capacidade da exaltação e da polêmica. De minha parte, considero-me redimido por encontrar na presente edição das obras de Carpeaux o sonho que persegui durante anos mas para a qual não tive tempo e competência para realizá-lo.

Carlos Heitor Cony é romancista, Cronista e Memorialística. Pertence aos quadros da ABL. 

Quatro ensaios memoráveis de OTTO MARIA CARPEAUX







NOTAS

  1. Até 1997 os arquivos pessoais de OMC, conservados na Fundação Casa de Rui Barbosa, não tinham sido catalogados. [N.E.]
  2. V. uma lista no final destes Ensaios Reunidos. [N.E.] 
  3. Insuflado por um grupo de comunistas de Minas Gerais, que lhe passaram informações falsas sobre Carpeaux (falsas ao ponto de fazer do exilado um suspeito de simpatias nazistas), o romancista francês Georges Bernanos, homem honesto mas de temperamento arrebatado e colérico como aliás o próprio Carpeaux, embarcou na conversa e publicou um artigo furioso contra o crítico recém-naturalizado. O episódio está documentado em artigos que serão reproduzidos no volume de Escritos Políticos. Houve também uma "campanha sórdida liderada por Oswald de Andrade" (Franklin de Oliveira, A Semana de Arte Moderna na Contramão da História e Outros Ensaios, Rio, Topbooks, 1993, p. 146) e uma intriga armada pelo semanário Diretrizes, que explico mais adiante. — Tudo isto, naturalmemente, sem contar as puras incompreensões sem malícia, como a de Eduardo Portella, que acusou Carpeaux de não entender os "caracteres específicos" da literatura brasileira (besteira pura, como explico na p. 266 de O Imbecil Coletivo, 5a. ed.), ou a de Paulo Hecker Filho, que reduziu o crítico à estatura de "um grande jornalista" (título de um artigo conservado, sem data nem nome da publicação, entre os papéis de Carpeaux nos Arquivos da Fundação Casa de Rui Barbosa). [N.E.]
  4. Se hoje muitos de seus textos parecem de leitura difícil pela quantidade de alusões a obras e autores desconhecidos, é porque já não existe um público medianamente culto como o de quatro décadas atrás. Massacrado sob as toneladas de insignificâncias que a indústria editorial lhe impinge, o leitor de hoje acaba não tendo tempo para formar uma idéia do passado literário mediante a leitura dos autores básicos — justamente aqueles cujo conhecimento era possível dar por pressuposto no leitor médio da época de Carpeaux. [N.E.] 
  5. V. "A idéia de universidade e as idéias das classes médias". [N.E.]
  6. V. "Leviatã". [N.E.]
  7. V. no vol. III destes Ensaios Reunidos, "Agonia do liberalismo". [N.E.]
  8. Enquanto eu preparava esta edição, os fatos do dia se incumbiram de mostrar o quanto podia ser profético esse apreciador de profetas que foi Otto Maria Carpeaux: os acontecimentos da PUC-Rio, que analisei em A Longa Marcha da Vaca para o Brejo (Rio, Topbooks, 1998), ilustram da maneira mais eloqüente "A idéia de universidade e as idéias das classes médias". [N.E.]
  9. Rosenstock-Huessy, filósofo e historiador empenhado em resgatar o elemento divino nas origens da linguagem (em estreita colaboração com o filósofo judeu Franz Rosenzweig, autor de A Estrela da Redenção), foi um dos inspiradores dos Peace Corps norte-americanos, contra os quais Carpeaux viria depois a escrever alguns artigos, sem dar sinal de saber da participação que neles tivera o seu venerado mestre. No belo comentário que Carpeaux em 1942 consagra a seu livro Revoluções Européias, Rosenstock-Huessy é designado apenas como Rosenstock, pois só veio a adotar o sobrenome Huessy ao transferir-se para os EUA no final dessa década. [N.E.]
  10. V. "Solidão de Croce". [N.E.]
  11. "Tradição e tradicionalismo". [N.E.]
  12. Id. — E não é significativo que mais tarde se tenha instaurado mais uma inquisição sob o pretexto de democracia racial, condenando como racista quem quer que ouse afirmar, por exemplo, a superioridade do cristianismo sobre os cultos de tribos antropófagas? [N.E.]
  13. V. "A lição de uma santa". [N.E.]
  14. Compare-se, por exemplo, seu elogio a Charles Morgan no ensaio "A lição de uma santa" (1942) com a irritada má vontade com que em 1966 ele fala do romancista na História da Literatura Ocidental, VII, p. 3372. [N.E.]
  15. Ele chega a procurar enxergar uma "utopia cristã" na República Espanhola de 1931 —explicitamente condenada pelo Papa por fazer vista grossa à violência comunista contra a Igreja, que acabou resultando, nos anos seguintes, no massacre de 19 mil padres e freiras antes mesmo do início da Guerra Civil. V. "García Lorca", em Origens e Fins. — Diante disso perde toda eficácia a incomparável retórica da "Oração fúnebre por Charles Maurras", onde Carpeaux, falando como porta-voz do catolicismo, assume a defesa da ortodoxia romana, que para atender a pressões do setor "progressista" condenara a Action Française, movimento ultradireitista — mas não anticatólico — chefiado por Maurras. Pois afinal a Action Française não cometera violência nenhuma e o próprio Maurras jamais defendera sequer uma aliança com o nazismo; ao contrário, insistira na necessidade de rearmar a França contra o ataque germânico, que julgava iminente, enquanto os líderes do progressismo (Emmanuel Mounier, por exemplo) pregavam o desmonte do Exército francês e enxergavam em Hitler "as melhores intenções". Maurras depois colaborou com o governo de Vichy, mas, quando no pós-guerra os progressistas o acusaram de "traição", foi apenas para esconder por trás da acusação as suas próprias vergonhas, já que eles mesmos tinham fomentado um resultado ao qual Maurras não fizera senão conformar-se ex post facto. Carpeaux, ao assumir o dircurso progressista contra Maurras, provavelmente ignorava estes fatos, que só vieram a ser enfatizados muito depois (v. Lucien Thomas, L’Action Française devant l’Église de Pie X à Pie XII, Paris, Nouvelles Éditions Latines, 1965). [N.E.]
  16. "Visão de Graciliano Ramos", em Origens e Fins. [N.E.]
  17. Emprego aqui "forma" e "matéria" no sentido aristotélico, não na acepção vulgar de "forma e conteúdo". [N.E.]
  18. Estetica come Scienza dell’Espressione e Linguistica Generale, 11a edizione, Bari, Laterza, 1965, pp. 24-25. [N.E.] 
  19. Erich Auerbach, Mimesis. The Representation of Reality in Western Literature, transl. by Willard Trask, New York, Doubleday, 1957. [N.E.]
  20. "Perspectivas da interpretação", em Livros na Mesa. [N.E.]
  21. Carpeaux não viveu o bastante para estudar em profundidade as novas tendências da crítica que se tornaram hegemônicas a partir da década de 70. (Apenas examinou de leve algumas idéias de Barthes e Lévi-Strauss num artigo publicado no Jornal do Brasil, "O tema é o estruturalismo" — v. o vol. III destes Ensaios Reunidos —, concluindo que a nova moda, nascida das desilusões da esquerda, era "um ópio dos intelectuais".) Mas creio que hoje subscreveria a opinião de Harold Bloom e René Girard, que reduzem essas tendências a sintomas de um ressentimento de acadêmicos medíocres contra a literatura criadora. V. Harold Bloom, The Western Canon: The Books and School of the Ages. New York: Harcourt Brace, 1994; René Girard, A Theater of Envy: William Shakespeare. New York: Oxford University Press, 1991; e Mathew Schneider, "Mimetic Polemicism: René Girard and Harold Bloom contra the ‘School of resentment’. A review essay", em Anthropoetics II, no 1 (June 1996). [N.E.]
  22. História da Literatura Ocidental, "Introdução", vol. I, p. 30 da 2a edição (Rio, Alhambra, 1978). [N.E.] 
  23. "Obra-prima da literatura universal", em Livros na Mesa. [N.E.]
  24. V. História da Literatura Ocidental, pp. 34-36 da edição Alhambra. [N.E.]
  25. Outro injustiçado, outro homem nobre que sacrificou seu gênio e sua carreira literária ao jornalismo e à política de esquerda, para depois ser solenemente ignorado por imbecis presunçosos que não seriam dignos de lhe beijar os pés. Franklin escreveu a única coletânea de ensaios que pode ser comparada sem desvantagem às de Otto Maria Carpeaux: A Fantasia Exata. Ensaios de Literatura e Música (Rio, Zahar, 1959). Só o insubstituível José Mário Pereira tem feito algo por que não se perca o legado dessa grande alma e grande inteligência, editando por exemplo "antologia crítica" A Dança das Letras (Rio, Topbooks, 1991). [N.E.] 
  26. Thomas Mann, Doutor Fausto, trad. Herbert Caro, Rio, Nova Fronteira, 1984, p. 13. [N.E.]
  27. "Hofmannsthal e seu Gran Teatro del Mundo", em A Cinza do Purgatório.. [N.E.]

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